Não raras vezes algo
curioso acontece comigo, acredito que com vocês também. Vira e mexe me pego em
reflexões sobre em que medida somos livres. Ou mesmo se efetivamente o somos.
Existe um sem número de autores que já trataram do tema e, seus livros, se
reunidos, com certeza comporiam bibliotecas inteiras. Não nego isso. Sei que o
tema não é nada original. Mas isso não importa.
Somos livres e presos, ao
mesmo tempo. Foi isso que minha extremamente limitada razão foi capaz de
deduzir. Nossa experiência de liberdade é exercida somente no plano concreto,
do real, de vivências efetivas. E são esses os planos que limitam a nossa
liberdade.
Há, portanto, não uma
exclusão, como em princípio soa intuitivo, entre liberdade e limitação a ela,
mas sim uma relação de condição. A liberdade se condiciona a determinados
limites, pois sem eles ela simplesmente não seria realizável, vivível enquanto
experiência. Tentarei ser mais claro. Pense que alguém é infinitamente livre.
Ser “infinitamente livre” é uma construção textual apenas, já que como se é
livre se há um infinito universo de possibilidades, de decisões a serem
tomadas?
É impossível ser
infinitamente livre na medida em que a possibilidade de escolha de uma entre
infinitas possibilidades é nenhuma. Sei que pode parecer bastante abstrato e
até confuso, mas se prendam na ideia de uma liberdade infinita. A partir daí, notem
que se é infinita, qual caminho se irá escolher? É possível dizer “qualquer um”,
mas um dentre quais, se eles são infinitos? O que percebi, raciocinando dessa
maneira, é que UMA EXPERIÊNCIA DE LIBERDADE INFINITA É ABSURDA. Essa reflexão
me permitiu concluir que A LIBERDADE COEXISTE NECESSARIAMENTE COM SEUS LIMITES.
Nesse ponto, me recordei do conceito sartriano de facticidade, e acho que se
trata exatamente desses limites que, paradoxalmente, permitem a experiência da
liberdade.
Partindo dessa
constatação, a de que a liberdade é inevitavelmente limitada, penso no grande
número de pessoas insatisfeitas com a liberdade que possuem, exatamente por ser
essa necessariamente limitada. Isso me fez lembrar uma frase de Voltaire, que
quero compartilhar com vocês: “É ESTRANHO
QUE OS HOMENS NÃO ESTEJAM CONTENTES COM ESSA MEDIDA DE LIBERDADE, ISTO É, COM O
PODER QUE RECEBERAM DA NATUREZA DE FAZER, EM VÁRIAS SITUAÇÕES, O QUE ELES
QUEREM; OS ASTROS NÃO TEM ESSES PODER.”. Depois dessa lição de
François-Marie Arouet, deveríamos pensar muito antes de nos queixar de nossa
eventual insuficiência de meios...
Essa história do absurdo
de uma liberdade infinita, também me fez pensar sobre o livre arbítrio. Como já
disse, não possuo uma razão excepcional, minha mente é bastante simples, por
isso não pretendo propor verdades absolutas, até porque, mesmo partindo da
minha mente rústica, sei que elas não existem. O livre arbítrio seria também
apenas uma construção linguística, uma ilusão? A boa e velha SINCRONICIDADE me
presenteou com uma reflexão singular de Voltaire, sim, ele de novo! E eu que
não o imaginava como filósofo! Vejam só: “SERIA
MUITO SINGULAR QUE TODA A NATUREZA, QUE TODOS OS ASTROS OBEDECESSEM A LEIS
ETERNAS E QUE HOUVESSE UM PEQUENO ANIMAL DE UM METRO E MEIO DE ALTURA QUE, A
DESPEITO DESSAS LEIS, PUDESSE AGIR SEMPRE COMO LHE AGRADASSE, MOVIDO APENAS POR
SEU CAPRICHO”. Genial, não? Eis nossa belíssima tragédia: nos consideramos
livres, uma liberdade, porém, que não se exerce infinitamente, é circunscrita,
necessariamente delimitada. Mas, a nossa vontade de agir, o que nos impele a
escolher este e não aquele caminho, será completamente livre? Em que medida as
leis da natureza poderiam nos condicionar a agir de possíveis modos?
O que me levou a escrever
esse texto? Até que ponto esses questionamentos necessariamente me ocorreriam?
Não ocorrem apenas em função das minhas experiências de vida? Ou haveria algo
inato, tal como o fato de eu ser libriano e, segundo a astrologia, os nascidos
em libra tenderem a ser reflexivos, tais como todos os nascidos em outras das
três casas pertencentes ao elemento ar? Voltaire certamente repudiaria essa
última sugestão. Eu não me considero capaz de solapá-la tão peremptoriamente.
Sou hesitante, outra característica típica dos librianos...
Se, como dizem os
dialéticos - tudo é e não é ao mesmo tempo -, quanto à liberdade, somos e não
somos livres. Independente de sermos ou não efetivamente livres, o que importa
é que algo somos.
É estonteante o quanto, talvez meio que caleidoscopiando a questão, a liberdade é a um só tempo tamanha e tão pouca.
ResponderExcluirGK
Não pretendo ser tão eloquente quanto vc, mas acho a última frase do texto a + importante: "...o que importa é que algo somos". Acredito que nisso se baseia a nossa existência, em sermos alguma coisa, não importa o quê, nem em que medida...ótimo texto!!!
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirSão as minhas mesmas indagações. Aquela HQ q t enviei tem um pouco dessa reflexão apesar de não ser o tema central da história. As escolhas, o sentido de existir, a inteligência... A razão parece não cooperar com a liberdade. Aliás, o que aparenta é que quanto mais razão menos liberdade e quanto menos razão mais liberdade. Neste último, a liberdade é conduzida pela aleatoriedade, enquanto a primeira pelo destino. Claro, o destino que o próprio sujeito traçou 'em mente' e não o destino regido por "forças universais". Contudo, a aleatoriedade das outras pessoas acaba interferindo no destino do sujeito, e consequentemente na sua liberdade. O movimento dessas peças acaba gerando as supostas forças universais (acasos do dia-a-dia: sorte ou azar, encontros e desencontros, coincidência ou descoincidência), e isso gera uma bola de neve q fica martelando em nossas mentes. Afinal, a vida tem algum significado ou a nossa existência é irrelevante perante o Universo? To be or not to be, that's the question.
ResponderExcluirGostei do texto.
Espero que volte com mais cafés como esse.